Você algum dia parou
Para ver os mendigos sem pêso,
Com suas doenças rifadas
E todo o devido desprêzo?
Você algum dia espiou
Travestís desfilando em calçadas,
Seus suspiros vendendo mentiras
E ilusões de uma vida abortada?
Você algum dia tragou
Bebeu no boteco uma ou duas,
Tentando encontrar em seu copo
O que te negavam nas ruas?
Você algum dia pagou
Luz vermelha, os carinhos da vida,
Transformou suas dores em gozo
Entendeu que seu gozo é ferida?
Você algum dia notou
Que hoje o céu é nenhum,
E o pó que cuspimos pra Deus
Nos cobre, felizes, em vala comum?
Você algum dia falou
Que viu sua terra morrendo,
Sem ligar que canalhas nos comprem
Somos iguais à quem está nos vendendo?
Você algum dia lembrou
De mim e minha vida vazia,
Meu inferno, minha solidão
Minhas noites de falsa alegria?
Você algum dia pensou
Não haver putas, viados, doidões,
Mas então quem seria você
Se nada no mundo fugisse aos padrões?
Você algum dia aceitou
Da TV os heróis de sua praça,
Nem perguntou o porquê disso tudo
Tudo no mundo é uma farsa?
E se não houvessem as vidas devassas?
E se não houvesse o mal feroz?
Só sei que por nossas desgraças
É que fabricam-se heróis.
Walter Biancardine é jornalista. E muito doido, também
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