Sinceridade? Ando bem de saco cheio de ser gente boa, bom ouvinte, gentil, educado, sempre entendendo os sentimentos dos outros e, às vezes, até mesmo servindo de confidente em relações desmoronadas ou inviáveis.
Pior que isso: quando uma mulher me procura para esse tipo de coisas, embora me sinta feliz por um lado – afinal, devo ser uma pessoa confiável e de bom senso – por outro desaba, feito uma laje em minha cabeça – a certeza de que sou completamente inofensivo.
Tenho a absoluta certeza de que quando uma mulher procura um homem para tentar entender seus sentimentos ou suas relações, e principalmente um homem mais velho, é porque ela nem sequer considera esta pessoa como homem, no sentido macho do termo. Um espécime do sexo masculino, que carrega uma boa bagagem de vida, pode ajudar com idéias, sugestões e dizer coisas agradáveis e animadoras – um livrinho de auto-ajuda interativo. E aí, tenho a consciência exata de minha exclusão do páreo.
Em algum momento de minha vida, deixei de ser excluído por ser feio, e passei a ser “não-considerado”, por ser velho.
Hoje não existe mais aquela rejeição explícita à minha volta, feito quando eu era adolescente e percebia que as meninas só falavam comigo o essencial, para não serem vistas com o feioso. Hoje, percebo que, se não há mais a debandada em torno de mim, existe o consentimento que o tio fique ali, sentadinho, tomando conta das meninas e passando um merthiolate quando necessário.
Confesso que para mim nem é das missões mais difíceis ou ingratas.
Tanto tempo de solidão, isso faz com que você seja grato à quem está próximo, ainda que por respeito aos mais velhos. É bom ver gente em volta de vez em quando, ouvir vozes chamando seu nome, saber que você ocupa um espaço físico na terra e que você não é transparente, as pessoas te vêem!
Mesmo a parte sentimental, depois de tantas portas na cara, pés na bunda e dispensas sumárias, não dói mais como doía antes. A vida e as pancadas foram amortecendo as dores, criando calos e construindo defesas.
Fico pensando se alguma delas cometeria a temeridade de escutar as minhas desventuras sentimentais. Com certeza não, papo de velho, ih!
Aliás, penso mesmo se existirá alguém no mundo que escute alguém – e que não tenha diploma, consultório, não cite Freud e nem cobre por isso.
Hoje posso enfrentar situações surreais, como escutar uma moça pela qual eu poderia estar interessado desfiar todo um rosário de lamentações porque uma cavalgadura imbecil mas com barriga de tanquinho não a trata com um mínimo de educação. E mesmo assim, ela o ama!
A reação mais forte que consigo ter é constatar que ambos se merecem, e reafirmar para mim mesmo a crença de que mulher gosta é de cafajeste – homem bonzinho é só para dar conselhos.
E assim mesmo, depois de velho.
Walter Biancardine é jornalista e jura que por debaixo da cara velha e feia existe um ser humano. E que tudo dói nele igualzinho dói em você.
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