domingo, 31 de março de 2024

REFLEXÕES DE UM DOMINGO DE PÁSCOA -

 


A Páscoa possui um significado particularmente marcante para mim, pois nesta data batizei-me tardiamente, puxado pelas orelhas por Santa Therezinha de Lisieux.

Mais que limpar-se de uma vida de erros, o batismo – tal qual o domingo pascal de hoje – representou um real renascimento para mim. Mal compreendido por uns, gerador de expectativas frustradas para outros, esta ressurreição pessoal custou-me um preço exorbitante, doloroso, mas vejo por fim ser impossível arrepender-me.

Vivendo este dia, cujo significado pessoal reputo possuir algo além do usual, achei-me particularmente disposto a escrever, produzir artigos e exercer o simples desejo de contribuir para que outras pessoas compartilhem pontos de vista e observações que considero importantes. Se para mim funcionou, talvez funcione e ajude outros igualmente.

Os mesmos seguem abaixo.


A POBREZA TEM SOLUÇÃO?

Um problema insolúvel não é um problema, é uma contingência.

O "problema social", "problema da pobreza", tudo isso é histórico e contingente à condição humana.

Políticos, filósofos, intelectuais e mesmo setores da igreja que conclamam "soluções", ou dizem possuí-las, para tais questões - apresentadas como "problemas" - não são nada além de fraudes, aproveitadores carreiristas ou singelos proclamadores de sua própria ignorância.

Quando não há solução, sempre restará a misericórdia.


SEM TÍTULO -

Neste domingo de Páscoa lembro que, ao menos por três dias, Nietzsche esteve certo: "Deus está morto", escreveu.

Até o mais miserável dos pecadores merece a misericórdia.

Agnus Dei, quis tollit pecatus mundi, miserere nobis.

Kirie Eleison


SEM TÍTULO II -

É fácil compreender o mundo e solucionar todos os problemas quando somos progressistas.

A causa é a burrice apoteótica do marxismo, que a tudo simplifica, dividindo conflitos em "nós" e "eles" e tornando tudo palatável, com "figurinhas para colorir".

Apenas a mais reles semântica.

O esquerdismo é burro.


A Palavra de Deus - A Revelação:

As Escrituras e a tradição da Igreja, ensinando ao longo dos séculos o que não está registrado nas Escrituras, compõem a Palavra de Deus, ou seja, a soma das Escrituras e da tradição é a Palavra de Deus.

O Magistério da Igreja Católica é o intérprete legítimo disto, e este é o tripé da Igreja e da fé cristã.

Ora, a teologia se extrai a partir deste Magistério mas, por razões outras, iniciou-se um movimento para se obtê-la a partir de outras óticas. E estas outras óticas podem ser as mais diversas e absurdas possíveis, tais como vê-las sob o ponto de vista dos pobres (teologia da libertação), dos gays, dos gordos, dos sem-terra e por aí em diante; tudo que fomente uma reflexão que quebre com a tradição será válido.

Um exemplo claro de tal pensamento - que fizeram de padres meros "coaches" motivacionais ou militantes ideológicos - é a "Campanha da Fraternidade 2024", elaborada por um sindicato de padres militantes chamado CNBB.

Quem se der ao trabalho de ler tal publicação, incansavelmente anual, verá que mais parece uma cartilha do PSOL, em suas exposições.

Hoje, é público e notório que a CNBB é o marxismo dentro da Igreja e que é dever, obrigação do verdadeiro católico, denunciar, combater e demonstrar publicamente seu repúdio à estes elementos - travestidos de sacerdotes - para sanear a Igreja.

O próprio Santo Tomás de Aquino já conclamava os fiéis a este bom combate, dizendo que "toda reação, se destinada a restabelecer a verdade, não só é correta como necessária.

Quem realmente possui algum estofo intelectual saberá que somente salvando a Igreja Católica, salvaremos o Brasil.


MISSA NÃO É FESTA -

Aplauso em uma missa, não importam as razões, é estupidez qualificada.

A missa é o ato de reviver o sacrifício de Jesus. Ora, e quem - fariseus à parte - aplaudiria o Cristo crucificado?

Não à toa as missas tradicionais (missas tridentinas, recomendo) tem, como única música, um soturno e transcendente órgão - nada de violões, baterias ou palmas.

Lembro tudo isso para manifestar minha estranheza, ao ver o padre de minha cidade conclamar os fiéis a aplaudirem o Cristo ressuscitado.

Pouco importa sua boa intenção: o estimado sacerdote esqueceu-se do caráter sacrificial desta liturgia, cedendo - na melhor hipótese - à postura de "coach motivacional".

Recomendo aos que me leem buscar, no Google, as igrejas de rito tridentino em seus estados.

É rezada em latim, segue a liturgia pré Concílio Vaticano II e o sacerdote está de costas para os fiéis, nunca para o altar de Deus.

Entendam: não se trata de condenar iniciativas como a Renovação Carismática, este é um outro assunto e merece artigo à parte. O que intenciono é vacinar o irmão católico, mostrando como é a liturgia tradicional, e imunizá-lo contra as inovações ce-ene-be-bistas (CNBB) que contaminam muitas paróquias em nosso país.

Irmão católico, salve sua igreja e você salvará o Brasil.


SOBRE COMO UM PRÉ-CONCEITO PODE ATROFIAR O PENSAMENTO -

Jamais escondi minha admiração e dilecção pelo filósofo francês Jacques Maritain.

Pensador profundíssimo, fui por ele cativado tal qual um leitor deixa-se seduzir pela capa de um livro, e a publicação que me chamava atenção era sua orientação tomista, pois Santo Tomás de Aquino – creio que todos sabem – é um dos objetos perenes de meus estudos. E este foi o pontapé inicial, para que eu mergulhasse em suas obras e pensamentos.

Portador de orientação católica, as obras deste filósofo influenciaram o conceito europeu de Democracia cristã – um conceito amplamente discutível mas que eu, em minha inocência intelectual de simples jovem dos anos 80, nada via de mal – pelo contrário.

Maritain escreveu mais de sessenta obras e é considerado por alguns como um dos pilares da renovação do pensamento tomista no século XX – o que não consigo concordar plenamente – e por outros, como inspirador ideológico das democracias cristãs na América Latina. Talvez nisto resida a explicação para a difusão de muitas obras suas, em um Brasil particularmente avesso à filosofia e cultura.

Segundo sua biografia, o filósofo nasceu em Paris em 1882, num ambiente familiar republicano e antiliberal, e morreu em Toulouse, 1973. Seus pais, Paul Maritain e Geneviève Favre, não o quiseram batizar – uma estranha coincidência com vicissitudes de minha própria vida, que tive de batizar-me de motu proprio.

Maritain estudou Filosofia na Sorbonne, onde prevalecia uma orientação positivista e ateia, pouquissimamente recomendável para a formação intelectual de qualquer pensador. Em Heidelberg conhece o poeta Charles Péguy e Raissa Oumansoff, uma imigrante judia cheia de intensa inquietude pela verdade, com a qual contrai matrimônio civil em 1904 em Berlim.

Maritain não encontrou no cientificismo da Sorbonne, onde estudou, as respostas para as suas inquietudes existenciais, o que o fez sintonizar-se com a aflição existencial de Raissa. Ambos decidem se suicidar – um comportamento explicitamente existencialista – mas, seguindo o conselho do seu comum amigo Peguy, o casal segue cursos com Henri Bergson, e apreendem dele o "sentido do absoluto", que será incorporado na peculiar metafísica "maritainiana". Trajetória estranha e arrítmica, que ora decide dar cabo de suas próprias vidas e, logo após, embrenham-se em cursos e aprendizados filosóficos.

Mas tarde conhece Leon Bloy, que o aproxima da Igreja Católica a ponto de converter o casal ao catolicismo e se tornar seu padrinho de batismo.

Acontecimentos posteriores levaram-no a se tornar um ácido crítico ao partido Democrata Cristão – quase uma obra sua – preferindo a criação de um movimento democrata-cristão que transcendesse os três partidos católicos franceses, local que adotara para viver. Seu pensamento teve profunda repercussão na América Latina, onde o "maritanismo" foi importante para as democracias-cristãs, mãe parideira de teatralidades políticas tais como Fernando Henrique Cardoso, PSDB e outras tristes lembranças – ainda ativas, contudo – na cena política brasileira.

Entre os autores influenciados por suas ideias estão Gabriela Mistral, Victoria Ocampo, Esther de Cárceres, Alceu Amoroso Lima, Gustavo Corção e Mário de Andrade – e esta breve lista nos fornece mais uma explicação para a difusão de seu pensamento em nossas terras.

O pensamento de Maritain provém de espírito positivista da Sorbonne e isso, entretanto, não me impediu de admirar a profundidade intelectual deste filósofo. O fato é que, após seu encontro com a filosofia de Bergson, na França, ele recupera suas esperanças na metafísica e a constrói, em seu modo sui generis.

Graças a sua esposa – paradoxalmente uma judia – e a Charles Peguy, conhece a Leon Bloy e se converte ao cristianismo, como já disse. Mas, neste contexto, conhece um dominicano (Padre Clérissac) que o aproxima da obra de Santo Tomás e, posteriormente, de Aristóteles.

Vivendo na França, cercado de todos os venenos filosóficos que o século XX fartamente produziu e de alguns de seus autores, encontrou naquele ambiente várias heresias: o modernismo, a teologia liberal, o personalismo e o pensamento social entre outros, além da alarmante iminência da eclosão da Segunda Grande Guerra. O período entre as guerras – Primeira e Segunda – é muito carregado de questionamentos da realidade e de procura existencial mas, tendo enfim se aprofundado na filosofia, estaria destinado a influenciar a ideologia da democracia-cristã.

O propósito deste artigo é mostrar, para aqueles que me seguem, que é possível divergir sem abominar e que existem alguns poucos autores, dos quais é sempre possível extrair contribuições e acréscimos, na construção de nosso intelecto, sem que venhamos a adotar seu pensamento na integralidade.

Em um momento excessivamente dualista como o que vivemos, onde a realidade é apresentada como binária – bem contra o mal – será pouco provável algum progresso intelectual, adotando-se esta postura. E não se trata de dar voz ou palco à "perniciosidades" já amplamente divulgadas mas, sim, utilizá-las discretamente em nosso favor, em nossas proposições dialéticas particulares e que podem – por quê não? - parirem teses filosóficas sadias.

Caso perguntem se recomendo a leitura de Jacques Maritain, responderei tal qual um comercial de bebidas: aprecie com moderação.



Walter Biancardine




sábado, 30 de março de 2024

BEBEDEIRA


Existem homens que passam uma vida bêbados de si mesmos;

Bêbados de suas vontades, de suas birras, de seus mimos e caprichos.

Aparentam lucidez, ponderação e bom senso, mas é a moeda que usam para pagar o próximo engradado de um ego em garrafas.

E seguem os dias de festa, o eterno brinde solitário, até que a sobriedade da desgraça os faça cair - não "em", mas "de" si.

E terão o resto de seus miseráveis dias de velhice e solidão para curar a ressaca de sua existência;

Que se evaporou como álcool. 


Walter Biancardine

quinta-feira, 28 de março de 2024

JÁ DISSE E REPITO: MAIS OLAVO, MENOS OLIVA!

As declarações absurdas do presidente do Superior Tribunal Militar (STM), Tenente-Brigadeiro do Ar e ministro Francisco Joseli Parente Camelo, afirmando candidamente que "a esquerda só quer um Brasil melhor", apenas corrobora toda a longa demonstração do verdadeiro e pernicioso caráter da instrução militar fornecida ao Alto Oficialato, que fiz em meu livro "Mais Olavo, Menos Oliva" https://clubedeautores.com.br/livro/mais-olavo-menos-oliva-2 .

Neste livro, demonstrei claramente o positivismo que empesta a caserna e tracei um comparativo ideológico, através do qual pode-se ver claramente que comunismo e positivismo são consanguíneos. O infame Brigadeiro, de motu proprio, endossou minha tese ao declarar - em tom quase de deboche - que "as pessoas tem mania de pensar que ser de esquerda é ser comunista. Isso não existe. Ser de esquerda é querer um Brasil melhor, um Brasil mais solidário, um Brasil mais próspero, um Brasil que pensa no mais pobre, é tudo isso que a esquerda pensa. Ser de esquerda não é ser comunista e o comunismo, para mim, não existe no nosso País”,

Para aqueles que ainda pensam em Bolsonaro como um covarde, que não soube se valer das Forças Armadas na hora certa, fica o lembrete que as mesmas jamais estiveram à serviço do povo brasileiro - basta ver o golpe de estado em que derrubaram o Imperador Dom Pedro II, amado e respeitado por brasileiros e estrangeiros - e instituíram, de cara, uma ditadura militar.

Para que um próximo Presidente conservador consiga de fato impor o pensamento dominante da maioria dos brasileiros, será necessária uma profunda reformulação, que não cabe neste pequeno artigo - apenas adianto, à título de "spoiler", que a destituição de todo o Alto Oficialato deverá ser sua primeira atitude.

Mais tarde desenvolverei este assunto.


Walter Biancardine



terça-feira, 26 de março de 2024

NÃO HÁ RELÓGIOS, NÃO HÁ LUGARES - APENAS RESPOSTAS

Manter-se raso talvez seja a melhor maneira de evitar o assombro diante do inefável, devidamente aquilatado por mente mais profunda, e que sequer seria reconhecido como tal por temerosos.

O que deve acontecer se dá sem hora marcada, sem local solene, conjunturas dramáticas ou teatrais músicas de fundo. Simplesmente se dá; apenas aceite, contemple e cresça.

Um local e situação prosaicos, em pé no ônibus, nada possuem de transcendental ou que induzam o pobre mortal à ascese. Talvez medicamentos poderosos tenham este condão, seus colaterais facilmente desviados rumo ao inexplicável mas o fato, em si, permanece o mesmo.

Um suor frio desce da testa, a escuridão invade o canto dos olhos, pernas enfraquecem e o primeiro pensamento é clínico: queda de pressão, desmaio, há que se buscar onde sentar - mas não há, ônibus cheio e implacável.

Seria desagradável manter-se apenas nisso e no exato momento em que um cérebro pragmático busca culpar medicamentos controladores da pressão arterial ou mesmo péssima alimentação duradoura, o mesmo é soterrado - de modo inopinado e sem razões prévias - por incrivelmente velozes lembranças de toda uma vida. E nossa infame existência passa, fast forward, diante de um perplexo ser pensante e que, até então, sequer recordava ou tinha consciência do tanto desfilado perante sua consciência.

Ver-se em terceira pessoa é desagradável e pior se torna quando assistimos, compungidos, os próprios pecados, felicidades ou banalidades sendo praticadas por aquela criatura que somos, mas não estamos. Ou, graças à Deus, fomos e não mais somos.

Se o melhor professor é o exemplo, estranha situação é nos enxergarmos diante de nossos olhos cometendo coisas boas e atos vis, o imbecil que fomos ensinando o convalescente que aspiramos ser.

Racionalizar o acontecido, organizar mentalmente a perplexidade, tentar dar um sentido e transformar o indizível em lição ou intervenção seria reduzir o transcendente ao concreto, o espírito à carne, o que flui ao que pesa. Não é a intenção.

Trata-se apenas de constatar que, aos que anseiam por respostas, as mesmas estão todas diante de nós.

Basta saber qual resposta cabe em cada pergunta.


Walter Biancardine 



sábado, 9 de março de 2024

SOLA SCRIPTURA - ou A AUSÊNCIA FILOSÓFICA


Dizer que a Bíblia é a palavra de Deus é uma metonímia, uma figura de linguagem, pois o Pai não aparece para mim a cada vez que a leio. Sequer foi ditada e sim, como sabemos, inspirada.

Assim, todo o Livro Sagrado é uma compilação feita pelos mesmos homens, católicos, e obra da Santa Madre Igreja tão desconsiderada por muitos crentes. Não fosse a Igreja Católica e não haveria a Septuagenta; não fossem os Doutores, Santos, frades, padres - criaturas, a carne insuflada pelo Espírito Santo - e não haveria, sequer, Bíblia. 

Ora, um mínimo de coerência exigiria uma menor "adoração" ao Livro Sagrado, afinal - usando um argumento que discordo mas muito ouço - ele é uma "criação", ainda que inspirada.

Sei, entretanto, que o acima escrito não fará nenhuma diferença para muitos - seja por ignorância filosófica ou preguiça de ler - e por isso sigo tranquilo, crendo na Igreja Católica como o corpo de Cristo e na determinação de Deus em salvar o homem pela humanidade de Nosso Senhor Jesus Cristo - uma explícita referência Teológica à ordem divina para que Moisés sacrificasse seu filho, seu único filho. 

Deus poupou o menino, mas não poupou seu próprio filho, Jesus, e o ofereceu em holocausto pela salvação do homem. 

Sigo crendo no magistério infalível da Santa Madre Igreja e que, só através dele, podemos alcançar as páginas Santas.

A Igreja é o Deus vivo, fundada por Ele para nossa salvação. 

Lutero foi um homem histórico mas, filosoficamente, analfabeto funcional.

Um fruto do humanismo de seu tempo.


Walter Biancardine 



quarta-feira, 6 de março de 2024

BATISMO EVANGÉLICO

 


Recentemente testemunhei, pela primeira vez, uma cerimônia de batismo de uma igreja evangélica, a comunidade eclesial Lagoinha, e que foi realizada no local onde trabalho.

Foi-me gentilmente oferecida a oportunidade de também batizar-me, convertendo-me, mas recusei polidamente – ciente de que a verdadeira fé nos impele à conversão do próximo mas, também, firme em minha própria fé católica e na certeza de que um juramento faz-se apenas uma única vez na vida.

Esta certeza de um único juramento lembrou-me do Credo Niceno-Constantinopolitano: Confiteor unum baptisma/ In remissionem peccatorum – “Creio em um só batismo/ Em remissão de meus pecados”. E este é um ponto de importância capital em nossa vida espiritual, dada a absoluta maioria católica e evangélica/ protestante (leia-se Batistas, Adventistas, etc.) no Brasil: a Igreja Católica aceita o batismo evangélico/ protestante, considera estes fiéis já unidos – embora não integralmente – ao corpo da Igreja Viva, e não impõe um novo batismo em caso de conversão.

Confesso ignorar se as Comunidades Eclesiais evangélicas exigem o batismo de novos membros, se oriundos da Igreja Católica. Caso exijam, fica a pergunta se não estariam sendo anabatistas – e apresso-me a explicar o que tal denominação significa: o termo significa "re-batizadores", do grego ανα (novamente) + βαπτιζω (batizar); em alemão: Wiedertäufer.

É a chamada "ala radical" da Reforma Protestante, iniciada por Lutero – daí o motivo da expressão em alemão, acima ilustrada.

Os anabatistas não formavam um único grupo ou igreja, pois havia diversos grupos assim chamados, genericamente, com crenças e práticas diferentes e divergentes. O ponto que julgo necessário destacar é que os convertidos eram batizados apenas na idade adulta e, por isso, re-batizavam todos os que já tivessem sido quando crianças, pois criam que o verdadeiro batismo só teria valor quando as pessoas se convertessem conscientemente a Cristo.

Pois bem, é evidente que o conceito acima exposto refere-se à pessoas já nascidas neste meio, mas cabe a pergunta: e os neófitos? E aqueles oriundos da Igreja Católica? Serão rebatizados ou o convite a mim dirigido foi uma gentileza, uma honra – certamente imerecida – que recebi?

Quero crer que as comunidades eclesiais evangélicas – Lagoinha inclusive – sigam ainda a orientação anabatista original, de Lutero, já que suas origens são protestantes. Assim, considerando a liberdade maior que tais comunidades possuem sobre suas práticas litúrgicas, deixo a sugestão de considerarem uma recíproca à esta fraternal postura da Santa Madre Igreja, dispensando o batismo de católicos convertidos, pois nosso Deus é Uno.

No mais, necessário é expressar novamente o reconhecimento da ação meritória e piedosa da Lagoinha, evidentes nos rostos e no trato de seus fiéis.

E que Deus Pai, Todo Poderoso, abençoe e proteja a todos nós.


Walter Biancardine





A MONTANHA PARIU UM RATO

 

Depois deste artigo, misto de análise e crônica pessoal, certamente pouco ou nada falarei sobre mim no que escreverei, futuramente. Entretanto, é necessário que seja – ainda desta vez – publicado tal depoimento pelo fato de jamais ter escondido fracassos ou sucessos, e aqueles que me acompanham certamente testemunharam um longo e doloroso abismo, vivido por mim, nos últimos tempos.

O mês de fevereiro foi-me particularmente terrível por coincidir duas rejeições simultâneas em minhas aspirações de trabalho e o fato, aleatório, de haver buscado o que era afinal o “narcisismo” o qual, um dia, fui “diagnosticado”. Assim, somou-se à uma auto estima nanica, desconsiderada profissionalmente, a terrível “descoberta” de ser um sociopata – verdadeira ameaça, escondida por trás de uma palavra que jamais julguei ir além da forma pejorativa de criticar o excesso de vaidade alheia.

Vamos direto ao ponto: decepções profissionais sempre são ruins, mas não o suficiente para abalar um profissional com décadas de experiência e – ainda que velado, raivoso – reconhecimento. Por outro lado, “descobrir” um sociopata habitando dentro de si, solerte e vitimando a mulher amada – causando mesmo o fim desta relação – equivale a saber, já na velhice, que todos os relacionamentos de sua vida foram baseados na tolerância dos outros para com sua doença – explícita, nociva, asquerosa, mas que apenas você não a enxergava. Ou seja, você foi alvo da piedade alheia; possuía amigos e relações apesar de ser quem você é. Uma farsa, enfim.

Todos sabem de tudo o que me aconteceu, de 2022 para cá: perdi mulher, casa, amigos, história de vida, raízes, família e fui morar de favor em uma ilha de nada, cercada de coisa nenhuma por todos os lados. Essa é a única desculpa que encontro para minha análise precipitada sobre esta “patologia”, a mim imputada, e por haver tomado como fontes válidas apenas vídeos de YouTube, ainda que apresentados por gente que se intitula “terapeuta”, “psicólogo” ou o que o valha.

Os nervos jamais foram bons conselheiros e ultimamente, mais calmo após assimilar a pancada recebida, busquei rever toda a longa série de avisos e advertências, anunciados por tais profissionais, nos vídeos que tanto mal me causaram.

A primeira coisa que chamou-me atenção foi o fato de 90% deles ser protagonizado por terapeutas mulheres, e a segunda foi o fato de tais vídeos – mais que técnicos – serem verdadeiros depoimentos: testemunhos que, em alguns deles, chegaram ao choro (!!!), vozes trêmulas e balbuciantes, demonstrando claramente que o fatal diagnóstico devia-se prioritariamente a mágoas pessoais, relacionamentos desfeitos, ódios e desejos claros de vingança destas profissionais contra seus antigos pares. E pouco se me dá a acusação de “machismo”, pois tal comportamento é, de fato, feminino. Homens vingam-se de modo diferente: arranjam outra mulher, compram carro novo e desfilam com ambos na frente da ex.

Como diabos não percebi isto antes? E por que raios uma profissional expõe-se deste modo, arriscando sua credibilidade e reputação? E concluí que a grande maioria de psicólogos e terapeutas abraça esta profissão muito mais pelo desejo de se compreender do que curar seus pacientes.

A afirmativa acima não deve ser refutada com ódio: a brilhante dra. Ana Beatriz Barbosa – reconhecida nacionalmente e que não possui canal no YouTube, apenas participa como convidada – é a prova e modelo de alguém que, realmente, está no ramo para ajudar e tem substância a oferecer.

Assistindo vídeos nos quais ela participa, percebi a evidente diferença de tom e ausência de frustrações pessoais em suas análises – explicou o que realmente é a patologia narcisista, os diferentes graus que pode alcançar e deixou bem claro que um doente deste mal, para chegar a tornar-se uma ameaça a terceiros, certamente apresentará comportamentos destoantes em todas as áreas de sua vida – indisfarçáveis, os quais certamente terminarão por fazê-lo ouvir, de mais de uma pessoa, a recomendação de tratar-se, buscar ajuda.

Incentivado pela serenidade da dra. Ana Beatriz, reconheci o ridículo de minhas buscas – instruir-me e diagnosticar-me em redes sociais é o fim da picada, tal como aceitar balizamentos leigos apenas pelo fato de amar esta pessoa profundamente.

Assim, era hora de usar um dos poucos dons que possuo – o autodidatismo – e buscar fontes literárias, sérias e de profissionais gabaritados, como parâmetro para análises.

Sei do perigo que isto representa, pois pouco ou nada enxergamos de nós mesmos. Entretanto, os que me acompanham sabem de minha longa jornada no deserto, no confessionário da solidão involuntária, enumerando para Deus os poucos pecados que em mim enxergo e escutando, Dele, os incontáveis que jamais vi. Deste modo, embora sabedor de minha miopia, percebi possuir uma auto consciência (ensinada e pregada por Olavo de Carvalho) infinitamente maior que a média das pessoas, e digo isso sem nenhuma modéstia.

E o que pude apurar? Ora, na respeitavelmente grande e densa bibliografia consultada (tudo em PDF, por falta de recursos), vi que as “terapeutas histéricas” das redes sociais não mentiram, ao revelar os extremos que um doente narcisista pode chegar.
Apenas esqueceram de dizer que são casos raros, exceções notáveis a olho nu – mas amores mal resolvidos realmente cegam as pessoas.

Um doente médio (chamemo-lo assim) narcisista é, de fato, uma pessoa que pode trazer inúmeros problemas a qualquer relacionamento. Entretanto, todos eles – sem exceção – possuem alguns traços em comum, dentre eles a certeza de serem criaturas acima da média. E foi a incapacidade alheia de distinguir entre comportamentos arrogantes eventuais e a hipótese de eu me considerar alguém “superior” que, certamente, decretou meu diagnóstico e o fim de meu casamento.

Nenhum narcisista reconhece sua postura “superior”. Já eu reconheço – e por vezes lamento tal auto defesa – minha arrogância pontual: Deus me deu poucos dons: dirigir ou pilotar qualquer coisa como aviões, motocicletas ou caminhões, aprender sozinho (suportar a solidão), uma inteligência funcional e o gosto em escrever. É só isso que tenho e sei fazer em minha vida, nada mais.

Quem comigo conviveu quando ainda voava, viu meu pior: definitivamente arrogante, competitivo, desafiador, agressivo no voo e nas discussões nas cantinas dos hangares, que sempre terminavam em pancadaria.

Mas resumia-se à isso. Jamais me gabei por suposta inteligência – e muitas vezes duvidei da mesma, quem me lê sabe – ou por escrever com alguma competência ou estilo. Mas sempre fui cabeça-dura: é difícil mudar minhas crenças, opiniões, valores; uma tarefa quase impossível e que pode conduzir o interlocutor à fatal suposição de “narcisismo”. Imagine conviver com alguém assim, em reuniões familiares?

Mas uma coisa é ser um sujeito desagradável e outra, bem diferente, é ser um sociopata.

O ponto central deste texto é, na verdade, pedir desculpas aos que me seguem por eu haver cedido ao pavor – descobrir-me incompetente na profissão e doente da psique – pavor infundado, agravado por todas as aflições já conhecidas de vocês, chegando ao ponto de considerar atitudes mais drásticas. Envergonho-me por tudo o que pensei e considerei, envergonho-me por desabar em uma fraqueza tamanha, ao ponto de provocar a solicitude de amigos como o dr. Vitor Travassos. E envergonho-me, principalmente, por esquecer a ponderação, serenidade e prudência na análise de uma situação – ainda que explicada (mas não justificada) por minhas misérias pessoais – que poderia ter me levado a atitudes estúpidas e, certamente, sem retorno ou perdão.

Havia prometido não mais escrever, não mais opinar, analisar. Pois neste momento revogo tal promessa.

Os livros, os estudos, a escrita; esta é minha vocação e nela continuarei. Neste momento, não tenho a segurança de realmente ter algo a oferecer além de análises, lastreadas não em sagacidade própria, mas em tudo que aprendi nos livros e com o professor Olavo de Carvalho – mas já é alguma coisa.

Minha situação pessoal continua a mesma mas, como dizem, “o que não pode ser solucionado, solucionado está” e, assim, continuarei tentando contribuir enquanto tiver um teto para me abrigar e condições mínimas de vida.

Decidi não mais deixar-me seduzir por sonhos – bom emprego, casa, carro – nem vencerem-me os pesadelos – sociopatias, incompetência, miséria e solidão.

Já é tempo de arregaçar as mangas e voltar ao trabalho. O país inteiro agoniza e, se posso contribuir com um só tijolo que seja, em nosso muro de combate, assim o farei.

Não mais falarei de mim, nunca mais. Ou serei, realmente, um narcisista.

É hora de curar o Brasil.

Agradeço a paciência e compreensão de todos. De volta ao trabalho.



Walter Biancardine



domingo, 3 de março de 2024

LUTA SEM FIM: RAZÃO X EMOÇÃO, INTELECTO X FÉ

 

Os adversários do título foram dispostos de maneira deliberada, pois não há como confrontar a razão com a fé, após Santo Tomás de Aquino e sua Suma Teológica: para quem leu – e entendeu – o santo Doutor da Igreja Católica, ambas coexistem interdependentes e pacificamente.

A razão e a emoção -

Um adversário melhor e constantemente utilizado contra a razão são as emoções – e mesmo sabendo o quão batido é este duelo, ouso oferecer uma análise em decorrência de um acontecimento o qual tive a inusitada oportunidade de estar presente, neste sábado, em meu trabalho: o amigo (e patrão) Alair Corrêa cedeu as instalações da pousada a qual gerencio para que pastores e membros da igreja Lagoinha lá realizassem uma cerimônia de batismo coletivo de quase cem fiéis.

Profissionais gabaritados – oriundos desta mesma igreja – exibiram como realmente se deve trabalhar, no preparo do evento. Ágeis, divididos em equipes autônomas mas sob comando central, eficientes e disciplinados, preencheram todas as minhas expectativas sobre como deve ser cumprida uma missão: com planejamento, disciplina, rapidez e eficiência. Em duas horas, tudo estava pronto. As cinco centenas de fiéis que compareceram e de tudo desfrutaram, somados ao apuro organizacional já citado, confesso, impressionaram minha razão.

Não estaria sendo justo, entretanto, se restringisse a boa impressão aos afagos feitos ao racional: observando os fiéis – em especial os casais, jovens ou nem tanto – pude perceber expressões de enlevo mútuo; ambos olhando-se com admiração e amor, carinhos e cuidados normalmente vistos apenas em raríssimos momentos de nossa brutal e cotidiana vida, tão raros que provocam o deboche de hordas invejosas que, igualmente, os percebam. E esta emoção me levou ao velho hábito de pensar, de buscar a razão primeira, a verdade – o feio cacoete filosófico, moribundo, que insiste em viver dentro de mim. E começou o jogo, provocado pela razão.

Ora, nisto tudo certamente haverá algo de muito poderoso, que harmoniza casais, que faz pessoas exibirem, involuntariamente, uma felicidade verdadeira, que equilibra e estabiliza mentes torturadas e sequeladas por traumas, vícios ou por nossa infeliz ausência completa de valores – gnósticos terminais que somos. São quase um bando à parte, tais fiéis: não digo sobre a maneira de falarem entre si, quase um dialeto o qual creio desnecessário, mas como se tratam. Fisionomias que exibem uma paz interior que, confesso, só posso recordar de enxergar quando da lembrança de pessoas muito antigas, tempos idos, modos de vida que hoje seriam tidos como inaceitáveis e retrógrados. Ponto para a emoção.

Então o pastor – cujo nome não lembro – começou a falar. Enquanto o mesmo fazia sua pregação, pude notar os rostos deslumbrados dos que o ouviam e a razão apressou-me a considerar uma espécie de catarse coletiva, somada ao tom motivacional dos melhores “coaches” de auto-ajuda, mas era na verdade uma histeria – e emprego a palavra em seu sentido original, hysteros (útero, em grego), para evitar um errado entendimento sobre o que vi: muito mais uma absorção completa da felicidade emanada, verdadeira ascese, do que mentes baratinadas sob treinamento pavloviano.

Teimoso, insisti na hipótese “auto-ajuda” e sentia-me pronto a dar a vitória à razão neste round, quando uma frase – uma só, única mas com a precisão de um sniper, dita pelo pastor – atingiu-me em cheio: “(…) porque Deus está aqui! Deus não está lá no céu, está aqui, entre nós!

Todos temos pontos fracos e quem me acompanha, conhece os meus: a solidão, o desamparo, a desesperança, causados pela (não tão) recente e brutal guinada em minha vida. E tal frase fez com que todo o enorme arranha-céu de concreto frio e impassível, erigido como um obelisco social às minhas misérias, implodisse. Não lembro se fiz algum gesto, se me portei de forma diferente, mas provavelmente algo de vexaminoso em mim chamou a atenção de meu amigo, Dr. Vitor Travassos – membro desta igreja e que também lá estava – fazendo com que ele se aproximasse e oferecesse sua boa vontade ao moribundo moral que encontrou.

O intelecto e a fé -

Habitué da solidão, aluguei-lhe a pobre orelha durante uns dez minutos, vomitando minhas mágoas, medos, frustrações – certamente o doutor, com seus anos de experiência, sabe muito bem dos riscos que representa à paciência de qualquer um, o oferecimento para ouvir solitários – mas, ainda assim, mostrei um comportamento que eu próprio jamais pude imaginar em mim: muito mais fácil escrever sobre meus tormentos para quem jamais verá meu rosto, que lastimá-los a alguém ao nosso lado.

Mesmo sabendo que sou católico, crismado e devoto de Santa Terezinha de Lisieux, o bom doutor perguntou se eu não desejava ser batizado. E nisto enxerguei um homem de profunda fé, pois foi ao encontro do que igualmente acredito: o verdadeiro crente respeita todos os crentes, mas nenhuma de suas religiões – pois só a sua é a verdade e salvação. Ponto para o intelecto, e para o doutor também.

Confesso que balancei, mas prioritariamente por mágoas pessoais já que minha madrinha – minha tia – igualmente acha-me hoje um psicopata narcisista, por conta de feridas sentimentais de sua filha – minha prima e ex mulher – e o verdadeiro papel de uma mãe é estar ao lado dos filhos, contra tudo e contra todos.

Somado a isso também há o fato que as igrejas evangélicas são muito mais acessíveis aos que sofrem: entre em uma delas e prontamente haverá alguém a perguntar em quê pode ajudar, qual sua dor – além das falas pastorais tocarem em pontos cotidianos que atormentam e desgraçam tantas vidas e famílias, apontando as direções para a cura. Você não se sente mais só, existem mãos e boa vontade para ajudá-lo, ânimo e perseverança são injetados em você – mas em boa hora percebi que tudo isso relaciona-se à nossa vida terrena, não à redenção de minha alma, que busco desesperadamente.

Em uma igreja católica você entra e está só, é você e Deus. Silêncio, meditação, confissão e penitência – tal como a existência de náufrago empurrou-me a viver, nos últimos tempos. O deserto, real, interior ou ambos; objeto de meus estudos a ponto de considerá-lo (uma tese filosófica minha) verdadeiro personagem bíblico, por sua presença necessária e decisiva em toda a Verdade Revelada.

Deus não veio a mim em uma epifania, milagres, portentos ou maravilhas. Jamais ouvi a voz do Pai, mas cada dia escuto mais forte – em seu silêncio grave – o que Ele me diz. E se minha porca fé claudica, há um Santo Tomás de Aquino, um Santo Agostinho, doutores, santos e santas (em especial Santa Terezinha, que levou-me pelas orelhas à Deus) ao longo de dois milênios de sabedoria, liturgia, ponderação, sempre confirmadas pelo tempo.

E este foi o ponto final, vitorioso, da fé.

Talvez falte aos padres o senso prático, a realidade da vida para ser aconselhada, tal como os pastores fazem. Talvez falte à igreja católica as mãos estendidas, oferecidas pelas evangélicas, aos desesperados.

Mas também faltam aos evangélicos o silêncio introspectivo, a meditação e – principalmente – sacramentos católicos, que nos fazem meditar e ter uma grande empatia com terceiros, ainda faltante no universo protestante.

Falta, aos que seguiram após Martinho Lutero, dois mil anos de uma teologia sólida, perene e eterna.

Mas não será a abissal ignorância de alguém como eu que conciliará a salvação evangélica da vida com a grandeza católica da salvação das almas, que são imortais.

Permaneço em minha fé, ela venceu.

Kyrie eleison.



Walter Biancardine