sábado, 20 de outubro de 2007

Pobreza pega

Mantendo promessa que fiz semana passada, na qual eu jurava não escrever mais nada de sério, resolvi que esta semana não vou escrever sobre coisa alguma. Sim, porque, considerando minha situação financeira, sexual, profissional, automotiva, erótica e eleitoral, tudo à minha volta é seriíssimo.
Tomo como base meu elevado status quo social: tenho horror a essa pobreza de churrasquinho na laje, e é só o que vejo à minha volta nos sábados e domingos. Aquelas barangas gordas, enormes, com aqueles maridos igualmente obesos (coisa que eu não consigo entender: todos se dizem uns coitados, que quase não tem o que comer. São gordos de quê, então? Vento?), todos avançando sem o menor pudor para a carne de terceira que tosta nas churrasqueiras feitas de aros de caminhão. E tome cerveja, pagode, shortinhos enfiados nas bundas mais horríveis e flácidas, risos – risos não, gritos de desespero, guinchos para provar como somos alegres! Como podem ser pobres? Se eu gastasse por mês o que essa gente gasta em churrasquinho e cerveja num só fim de semana, eu teria de ter mais uns quatro ou cinco empregos.
E pobre não fala. Pobre berra. Pior que pobre berrando, só a fêmea da espécie guinchando com as crias: “Õ Maicon!!!! Desce desse muro, minino!!!!”, “Michele, Gislaine e Shaiene! Já pra dentro! Pára de galinhage no portão!!!” E tudo com aquela voz fininha, esganiçada, de cantora de ladainha do nordeste, impossível de se distinguir se foi Creuza ou Rousemar quem gritou – são idênticas.
Parece que quanto mais gordas, menores os shorts, as saias ou mais atochadas as calças leg.
É, porque pobre adora calça leg, com um topzinho pra segurar a peitarrama caída em cima de pelo menos três das sete barrigas em sucessão que a maioria delas tem.
Outra coisa incrível: a incapacidade de prever, ou ao menos relembrar a seqüência de desastres do último churrasco e assim evitá-los no presente. Em todos eles o cunhado fica “bebo” e mete o braço na mulher que berra; ela, por vingança, fica dando mole pro Edmílson PM (“quero só ver se ele é homem de se meter com um cabo da PM”); a tia idosa passa mal, que tem”pobrema de nervo, é nervosa e encostada, leva ela pro PU, gente”, alguém tem que chamar o Wellington ou o Washington, que os dois tem carro – ou a Brasília do Washington ou o Opala do Wellington – fora as garrafas que quebram, os cortes no pé e mais gritos por causa disso; as vizinhas discutindo porque uma delas quer ouvir um pancadão e a outra só gosta de axé, o Gilsinho que bebeu, gente, e vomitou tudo lá no banheiro!!
É o inferno na terra. E chamam isso de diversão, chegando felizes e realizados ao fim da peleja.
No extremo oposto, estão a tia e prima evangélicas, que não bebem, não fumam, não riem e não vivem – só condenam e ameaçam com as labaredas do inferno aqueles e aquelas que tem o despudor de ter as partes baixas abrasadas pelo fogo que o caramulhão comanda. Elas não perdem um só churrasco desses, na esperança de, segundo elas, “ganhar umas almas pro Sr.Jesus”. É claro que existem os fiéis sinceros mas, francamente, se o ambiente é tão devasso assim, o que fazem lá?
É por essas e outras que o governo ainda tem muita margem pra nos sacanear. Reclamamos de barriga cheia, porque comer, beber, rebolar e acasalar são as supremas aspirações de 99% do povo brasileiro.
O resto, tipo cultura, politização, postura e dignidade de comportamento – dar-se ao respeito, como diria vovó, é tudo coisa de boiola.
Eu e Caco Antibes temos horror a pobre. Pobres de espírito, pois deles é o domínio da terra.
Eu, heim? Sou pobre, mas sou limpinho.


Walter Biancardine é jornalista, riquíssimo, fino, chique, sofisticado, aristocrático – um sebo, enfim. E é proprietário de um reluzente Chevette 82, invejado pelos seus vizinhos.

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