Quando a proximidade entre humanos e bichos chega ao ponto de criar qualquer espécie de laço - ainda que seja a visita unicamente para comer - tal fato quase sempre resultará em uma maior interação entre o homem e a criatura em questão; e se esta criatura começa a manifestar sinais de agrado pela simples visão, proximidade ou companhia do homem, existirá então, de fato, um laço afetivo.
O afeto é subjetivo e, mais que isso: transcendente. Existem provas por demais conhecidas do amor de um cão por seu dono e pergunto como negar a existência de alma em um ser vivente que ama, protege, defende e, por vezes, dá a vida por seu dono.
Tudo isso, entretanto, é pouco e mais se assemelha a construção de um auto de defesa, pois existe algo de muito mais profundo e que, dada a barbárie brutalista do ser humano atual, poucos enxergam: é aquilo somente dedutível, presumível, algo que podemos enxergar, sentir, mas jamais descrever - e o exemplo está na fotografia que ilustra estes devaneios.
O que você enxerga nos olhos deste cão? Ou fixou-se apenas em seu inegável sorriso de felicidade? Não viu o amor em seus olhos? O olhar sorridente, em sincronia com a boca? Todo o afeto que demonstra de modo tão evidente?
Teria alguém o atrevimento de afirmar, mesmo que baseado nas Sagradas Escrituras, que animais - em especial o cão - não tem alma? Como negar aquilo que vemos?
Ao me mudar para minha nova casa, tive de deixar meu único amigo para trás, o Sr. Wilson, meu cão que me adotou em meu naufrágio na vida. O proprietário da casa não aceita animais e eu, em minha ansiedade de ver-me livre do símbolo de minha derrocada, aceitei.
Não foi uma "Escolha de Sofia" mas, sim, uma escolha canalha - não poderia ter feito isso. Ainda que o tenha deixado em boas mãos, a consciência pesa-me todos os dias, lembrando que abandonei aquele único que esteve ao meu lado, em meus mais tenebrosos dias.
Espero, em breve, ter condições financeiras de alugar outra casa, e contar com a sorte do novo dono cedê-lo de volta a mim.
Até que isso aconteça, nada me fará menos canalha do que eu me sinto, hoje em dia.
Walter Biancardine
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Sr. Wilson, meu cão: ele me procurou e me adotou, em meu naufrágio da vida. Nada pediu, nada reclamou, apenas foi minha companhia durante os piores anos de minha vida. Que ele me perdoe. |
A título de esclarecimento:
A Igreja Católica tem uma visão específica sobre a alma dos animais. De acordo com a teologia cristã tradicional, especialmente a tomista, os animais possuem uma alma sensitiva, que lhes dá vida e permite que tenham percepções e sentimentos, mas essa alma não é espiritual e imortal como a dos seres humanos. Apenas os seres humanos têm uma alma racional e imortal, criada diretamente por Deus. Santo Tomás de Aquino argumentava que a alma dos animais perece com a morte do corpo, enquanto a alma humana continua a existir.
O Papa Francisco, em algumas ocasiões, fez comentários que foram interpretados como uma abertura à ideia de que os animais poderiam ir para o Céu, mas isso não reflete uma mudança oficial na doutrina.
Filosofia Clássica:
Na tradição aristotélica, que influenciou profundamente o pensamento cristão, Aristóteles distingue três tipos de alma:
Alma vegetativa – presente nas plantas (crescimento e nutrição).
Alma sensitiva – presente nos animais (percepção, movimento e desejo).
Alma racional – exclusiva do ser humano, dotada de razão e imortalidade.
Platão, por outro lado, tinha uma visão mais espiritualizada da alma e chegou a sugerir, no Fédon e no Timeu, que as almas poderiam reencarnar em diferentes formas de vida, inclusive animais.
Em resumo, tanto na tradição aristotélica quanto na doutrina católica, os animais possuem alma, mas esta não tem a característica da imortalidade, sendo essencialmente mortal e ligada às funções biológicas.
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