Em meu último artigo relatei recentíssima viagem que fiz ao Rio de Janeiro, usando-a como pano de fundo para diversas reflexões que me vieram à cabeça, estrada a fora – manias de ex-caminhoneiro, ex-motociclista e ex-andarilho, perdido na vida.
Sob o feitiço que as estradas sempre exerceram sobre mim, murmurei quanto à solidão, resmunguei privações e apertos, grunhi a respeito do isolamento de tudo e todos e, principalmente, rosnei contra um incerto, duvidoso e improvável futuro amoroso – romances, beijos e descobertas fascinantes são para jovens, e pouco se me dá o filme de Clint Eastwood (As Pontes de Madison) tentar resgatar, ao nível do viável, um romance entre criaturas com mais rugas que anos restantes de vida.
Contei, no artigo anterior, que a estrada acabou sem que meus pensamentos corrosivos cessassem, mas não disse tudo: a verdade é que, antes de rumar para casa, algum mórbido impulso levou-me ao bar do grande amigo, quase irmão e já falecido Rei do Rock, Luís Antônio, dono do The House of Rock and Roll, em Armação dos Búzios.
Adentrei o local – palco de tantas lembranças, alegrias inesquecíveis e companhias idem – e lá encontrei circunspecto rapaz, funcionário do bar, que consertava algumas cadeiras para a noite promissora. Narrei-lhe ínfima parte de minha história com a casa e com o Rei do Rock, o mesmo se espantou e prontamente se dispôs a tirar algumas fotografias minhas, o que muito agradeci.
Pensei nos anos passados, pensei em meu “brother” Luís Antônio, lembrei mesmo de minha vida errática sobre enorme motocicleta estradeira – escudo de motoclube nas costas – a perambular pelas estradas e desfrutar da viciante sensação de estar vivo sobre a terra. Mas lembrei também de pessoas que se foram, dos erros que cometi e tais “insights” foram suficientes para encerrar minha breve carreira como modelo do The House: chega de fotos, é hora de ir para casa.
O tempo não pára e, muito menos, anda para trás.
Tal viagem ao Rio – decisiva, como diz o título deste – teve o condão de ser um ponto final e definitivo em longo rastro de sangue que espalhei ao longo do caminho trilhado, pouco me importando com a repulsiva hemorragia de mágoas, solidões e tristezas que deixava pingar pelo chão. Ainda que anêmico, percebi-me curado: não mais passados, não mais assuntos irresolvíveis – se assim me parecem, assim serão.
E me dei conta que estas são as fundações para que se possa construir uma nova vida – solo sepulto, compactado e firme – com outros amores e novas alegrias.
Não sei quando nem como será, mas Deus não usa relógio: na hora certa, um amor baterá à minha porta e ela será explícita: “apenas quis te ver”.
Bendita seja esta viagem, que me abriu os olhos e ressuscitou meu coração.
Minha vida sempre foi, de fato, uma longa, longa estrada.
Walter Biancardine
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