Para piorar, a alegria automática de vizinhos – acionada a cada feriado ou data comemorativa – me entope olhos e ouvidos com sua barulhenta e vulgar gritaria; gargalhadas insofríveis e vocabulário de estivadores sempre complementarão o quadro o qual, pudesse eu, sequer veria ou escutaria.
Este ano, entretanto, foi um pouco diferente. À parte o fato de ter eu dado alguns tímidos passos adiante – realmente isso, em nada, mudaria meu péssimo estado de espírito – o que acendeu alguma luz em minhas trevas natalinas foi a aparição de graciosa senhorita, a qual não devo declinar o nome e que, visitando-me, convidou este escriba a assistir a Missa Solene de Natal, na Matriz Auxiliar de Cabo Frio.
É indiscutível o tanto que tenho a agradecer a Deus, que olhou para mim através da intercessão de Sta. Therezinha de Lisieux. Confesso, entretanto, que a ideia me atraiu principalmente pela companhia que eu teria e, também, pelo fato de poder ver gente – sim, pasmem: gente.
Na Matriz divisei figuras conhecidas, como o Prefeito eleito Dr. Serginho e mesmo seu secretário de governo, Alfredo Gonçalves. Vi centenas e centenas de cabeças, enchendo as dependências da espaçosa Nave – um tanto assemelhada a um teatro, confesso – e, finalmente, me senti como parte integrante da sociedade. Sim, pude saber que havia voltado ao convívio humano normal; as pessoas me enxergavam, cumprimentavam, falavam comigo.
Conhecedora profunda da liturgia católica, minha graciosa companhia orientava o que este impenitente deveria fazer: persignar-se, ajoelhar, ficar de pé e assim por diante. E tentei balbuciar toscos agradecimentos por todo o feito em mim, suplicando que me mantenha digno de tal e tamanho perdão concedido.
Cheguei de volta a minha casa já tarde da noite mas, ainda assim, tive tempo e lucidez para tecer algumas decisões as quais, se tudo der certo, tentarei cumprir neste 2025: a primeira coisa será voltar a fazer vídeos no YouTube. Não se espantem; mesmo com 28 deles removidos, submetido a um eterno “shadow ban” e com o canal definitivamente desmonetizado, a verdade é que não posso simplesmente abdicar de uma plataforma que permite a poucos e eventuais desconhecidos acessarem o que tenho a dizer. Que sejam poucos, mas sempre serão mais alguns.
A outra decisão tomada será a firme determinação – uma promessa, que seja – de voltar a escrever os livros que deixei pela metade, acabrunhado que estava em meio a tamanha surra que levava da vida. Estou de pé, tenho um teto sobre minha cabeça, posso comer comidas normais – não mais os eternos sanduíches, único meio sem fogões ou geladeiras disponíveis – e não ando mais a pé.
E por último, mas não menos importante, devo prestar séria atenção a quem me cerca pois não estou mais sozinho. Embora a solidão faça parte de meu DNA e dela precise em muitos momentos, a rotina do deserto se foi, e é hora de apreciar quem veio ao meu encontro neste Natal.
Afinal, segundo a graciosa senhorita, ela “apenas quis me ver”.
E quem me acompanha lembrou-se do que isto quer dizer.
Walter Biancardine
Nenhum comentário:
Postar um comentário