Por vezes penso na vida como uma rodovia, na qual trafegamos ao longo de nossa existência, com o tempo vindo na direção contrária pela outra pista. Na juventude o vemos de frente, vindo para nós com uma bela fachada sugerindo sonhos e promessas, realizações e conquistas.
Ao nos tornarmos adultos é o momento em que cruzamos na pista, nós seguindo em um sentido e o tempo em outro, mas nos perdemos tentando controlar o carro em meio ao turbilhão de ventos, barulhos, fumaças e a inevitável fuligem, que cega nossos olhos e os fazem lacrimejar.
A velhice chega quando este cruzamento já se deu e vemos o tempo pelas costas, se afastando, cada vez mais distante, menos barulhento – e nesta imagem se resume a vida de alguém feliz. É o momento de aproveitar o que nos resta de estrada, sentir seus cheiros, apreciar suas curvas e a bela paisagem em volta. Mas, como disse, tal se dá apenas com os felizes, os bem-resolvidos, aqueles que venceram.
Para alguns, como eu, a coisa desenrola de modo diferente. Após o turbilhão do cruzamento, percebi que meu carro acabou a gasolina e tive de encostá-lo no acostamento. Olhei para trás e vi o tempo – um enorme, poeirento e sinistro caminhão – igualmente estacionando, mantendo o motor ligado e sem nada dizer ou mostrar.
Pessoas como eu não conseguem deixar de escutar o motor deste bruto, murmurando ameaçador, em marcha lenta, a responder coisas que jamais tive a coragem – ou a perspicácia – de perguntar. A lufada de vento de seu deslocamento não pára, inexplicavelmente. Permanece jogando poeira em meus olhos, fazendo meu corpo balançar – um passado que nunca acaba, jamais fica para trás.
É como se fosse um caminhão mal-assombrado, povoado pelos fantasmas de meu passado que se recusaram a seguir estrada e resolveram ali parar, para me infernizar. Lembranças, arrependimentos, culpas – tudo ressurge, tudo reaparece, tudo renasce e re-machuca.
Amaldiçoo a vida, meu destino, mas lembro que a culpa sempre será minha: tive todas as chances de abastecer meu carro, de prepará-lo para a viagem, mas dispensei em minha imprudência e arrogância.
Agora, resta-me a sentença de permanecer ali, enguiçado e sendo obrigado a assistir a maratona de fantasmas que tal e sinistro caminhão jamais desistirá de me esfregar na cara.
Passei por todos os postos de gasolina, tive todas as chances e oportunidades, mas não parei em nenhum.
Agora é ficar aqui, até que a noite inevitável chegue e leve tudo embora.
Será um alívio.
Walter Biancardine

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