"Não é acidental que esse período testemunhe uma reviravolta generalizada da filosofia tradicional do sujeito em Kant, Hegel e Marx, tornando-se dolorosamente consciente do indivíduo como constituído até suas raízes por forças e processos completamente opacos à consciência cotidiana. Não importa que nome se dê a essas forças implacáveis, seu efeito é abrir um abismo intransponível entre a vida desperta do velho ego orgulhoso e os verdadeiros determinantes de sua identidade que estão sempre encobertos e inescrutáveis.
Se o sujeito está fraturado pela desorganização, o mundo objetivo que ele confronta é agora de apreensão bastante difícil, como resultado de sua própria atividade."
Terry Eagleton
Terry Eagleton, mesmo velhinho, continua a ser um acrobata do marxismo cultural vestido com o fraque da crítica literária. Mas vamos ao que me interessou nesta publicação do “Filosofia Sempre”, que apenas expõe pensamentos – não se detém a análises ou julgamentos, sempre é bom lembrar..
O texto é elegante, sedutor até – usa umas frases que parecem profundas porque se valem de expressões como “abismo intransponível” ou “forças implacáveis”. Mas, como diria Chesterton: nem toda névoa é mistério – às vezes é só fumaça de cigarro.
Primeiro ponto:
“Não é acidental que esse período testemunhe uma reviravolta generalizada da filosofia tradicional do sujeito em Kant, Hegel e Marx [...]”
Aqui começa a vigarice. Eagleton parte do pressuposto – que ele trata como fato inquestionável – de que houve uma "reviravolta generalizada" na concepção do sujeito. Evidentemente é uma leitura enviesada da modernidade filosófica, aquela típica de universitários da USP que enxergam Marx como o clímax inevitável de toda a história do pensamento ocidental. Ou seja: há aqui uma teleologia disfarçada, uma narrativa de progresso rumo ao desencantamento do sujeito, como se Kant, Hegel e Marx estivessem, todos, marchando juntos rumo à dissolução da identidade individual.
Segundo ponto:
“forças e processos completamente opacos à consciência cotidiana”
Mais uma vigarice freudo-marxista: o sujeito não se conhece, não é dono de si, está entregue a “estruturas” invisíveis, como se fosse uma marionete de forças históricas, inconscientes ou materiais. Aqui temos o núcleo do viés: a negação da agência individual e da responsabilidade pessoal, substituídas por um niilismo estrutural digamos… elegante.
Terceiro ponto:
“abrir um abismo intransponível entre a vida desperta do velho ego orgulhoso e os verdadeiros determinantes de sua identidade [...]”
Ou seja: você bobalhão, que pensa ser alguém, só está sendo enganado. Não por você mesmo – o que daria uma boa introspecção filosófica – mas por “forças históricas” e “estruturas”. O sujeito moderno, então, é um mero zumbi da História, sem liberdade verdadeira. O viés aqui é escancarado: é o projeto ideológico de deslegitimar o indivíduo como núcleo moral e racional, substituindo-o por um agente histórico-cósmico sem rosto – e sem culpas, é claro.
Último ponto:
“o mundo objetivo que ele confronta é agora de apreensão bastante difícil, como resultado de sua própria atividade.”
Aqui temos uma inversão canalha: culpa-se o sujeito pelo caos do mundo, mas no mesmo tempo em que se nega ter ele algum controle. Uma espécie de condenação ontológica com um quê de masoquismo teórico. Ou seja: você causou tudo isso mas não sabe como, nem por quê, e nunca vai saber. É o pecado original sem redenção, versão secular.
A verdade é que este texto tem mais viés do que aqueles espelhos curvos, de parque de diversões. É sofisticado – em sua vigarice – e embebido da velha desconfiança marxista quanto ao sujeito autônomo, e da negação radical da consciência como algo confiável. É uma crítica à modernidade feita do ponto de vista de quem já se entregou ao niilismo estrutural.
Verdades? Sim, no sentido de que muitos pensadores modernos realmente abalaram a centralidade do sujeito.
Mas o tom e a direção da análise são ideológicos, em níveis – digamos – de universidades públicas Federais.
Walter Biancardine
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