Tal caminhada é um hábito que aprendi ainda durante a vida de náufrago na roça, que impunha inacreditável solidão mas, em contrapartida, oferecia a liberdade de vagar falando sozinho, tal qual perfeito maluco, em derivações existenciais e filosóficas.
Neste passeio lembrei-me de um antigo sonho lamentoso, no qual imaginava eu que seria o que aconteceria no momento em que pudesse, finalmente, ir embora daqueles pastos e voltar a uma vida normal. Tal sonho - misto de lembrança e esperança - envolvia meu pai e minha mãe, somado a um enorme carro americano (típico dele) estacionado em uma picada no mato.
Em um fim de tarde, já cansados de caminhar, minha mãe seguraria-me pelas mãos e perguntaria ao meu pai se poderiamos ir embora. A resposta, bem ao tom de voz do velho: " - É, vamos embora. Vamos pra casa, tomar um café", dizia ele, já abrindo a porta do carro. E ao chegarmos em casa - sem nenhuma lógica, pois tratava-se apenas de um sonho - abriamos a porta e o cheiro de café, recém feito, invadia nossos narizes e nos dava a saudosa sensação de acolhimento e segurança.
Onde quero chegar, com tudo isso?
No dia em que finalmente pude deixar a casinha (minha eterna gratidão a Alair Corrêa), estacionei o carro na mesma picada de mato que, meses antes, derivava eu que estaria o automóvel de meu pai. Acendi um cigarro, abri a porta do carro e disse para mim mesmo: " - É, vamos embora. Vamos tomar um café."
Sim, foi premeditado. Sim, encarei como um sonho quase realizado. Não, não sou maluco, pois ao chegar em casa não havia o cheiro quente do café fresco. Aliás, nem café nem ninguém.
Mas agradeci a Deus do mesmo jeito, quase em lágrimas por ter Ele me concedido um sonho.
Pena não ter meus pais vivos para vê-lo.
Walter Biancardine
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