Generalizando, o Brasil é um país que saltou sem escalas das trevas coloniais diretamente para a sordidez dos guetos superpopulosos urbanos. Mal comparando, seria ir de Xambiobá à Rocinha, sem jamais ter sido Nova York.
Cidades que experimentam este processo, seguem todas elas o mesmo ciclo: um povoado estagnado, sem horizontes nem atrativos maiores que os da natureza, repentinamente descobrem um Eldorado – riquezas naturais ou até mesmo a instalação de poderosa indústria.
E aí começa a corrida do ouro, desenfreada e sem critérios maiores que o crescimento desordenado, onde o que vale é ganhar dinheiro e votos à todo custo.
A busca pelo dinheiro traz, primeiramente, a mão de obra capaz e qualificada que a cidade normalmente não dispõe. São pessoas que já têm – e gastam – dinheiro, gerando uma súbita demanda de bens e serviços. Os habitantes locais, normalmente sem maiores qualificações que as recomendadas pelo caráter, tentam à seu modo participar do ganho geral oferecendo-se para serviços mais humildes, como domésticas, caseiros, pedreiros, etc. A solidariedade familiar também conta, e cada um dos nativos que possuem parentes em outras cidades – normalmente tão ou mais pobres que eles – tratam de chama-los para tentarem sua sorte também. E a propaganda boca à boca faz sua parte, gerando a explosão demográfica exponencial de pessoas – sem qualificação – em busca de sua pepita no enorme garimpo urbano em crescimento.
Estes recém chegados, despreparados e sem escolaridade, geram filhos e mais filhos, que não esperarão mais de 15 ou 16 anos até gerarem outros filhos da miséria – muito provavelmente pouco dispostos a aceitar a vida como ela se apresenta e assim a escalada do crime começa, como complemento à favelização urbana e de pensamento.
Já a busca de votos à todo custo é a mão sinistra que permite – por ação ou omissão – a favelização do antigo paraíso. É bom notar que a palavra “favelização” é utilizada neste texto tanto no sentido literal quanto no de empobrecimento geral: de perspectivas, de nível cultural, de relações sociais, etc. É o agente do Estado que fecha seus olhos à ocupação urbana desordenada, que não se preocupa com a educação formal pública, que desembocaria necessariamente em maiores ambições individuais e, portanto, na qualificação profissional. Em última análise, é o degenerado que desvirtua a polis – crendo que a miséria é útil como cabresto eleitoral e como mão de obra barata, um Frankenstein criado por ele e que cedo não se deixará mais dominar, respondendo à seu modo – ou à bala – as desigualdades sociais.
Pode até estar certo no que diz respeito ao pouco valor do suor de seus eleitores, mas erra feio quando acha que eles sequer chegarão a suar – pois ninguém dará ocupação, por mais humilde que seja, àquele que não consegue alcançar a tarefa oferecida.
E assim se forma a enorme rodoviária – no artigo em pauta pode ser chamada de Cabo Frio – onde governantes ineptos fazem esforços e ações vistosas mas sem nenhuma efetividade no que tange à qualificação profissional. Esforços e ações igualmente vistosos mas também inúteis podem ser observados no eloqüente silêncio dedicado à escalada das favelas, antro gerador de indignidade e crime, sintoma de doença de uma sociedade tipicamente industrial, coisa que Cabo Frio jamais chegou a ser.
E daí se observa o porquê do título: Cabo Frio saiu da pesca e das salinas diretamente para o desemprego em massa e comércio fechado por traficantes.
Foi o salto direto, sem escalas, da barbárie à decadência. E jamais tivemos o direito à civilização.