Não vejo problemas em apreciar antiguidades, automóveis vintage, músicas de outras décadas – até porque as atuais não merecem assim serem classificadas – e demais apetrechos da rotina de outrora. Uma pessoa que não valoriza aquilo de bom que já foi feito não possui base para julgar o que lhe é oferecido nos dias atuais, e assim, satisfaz-se com qualquer coisa.
A preocupação começa quando começamos a achar os dias passados – memórias, em suma – melhores do que a árdua tarefa de viver o presente, e isso pode se configurar em verdadeira patologia, a depender do grau atingido.
Pois esta patologia atinge seu grau máximo quando gastamos os dias que Deus nos deu a lamentar por amores perdidos – na verdade, perdido está quem assim age, pois sofre de uma dor que se condenou a não mais parar de sentir. “E se eu não tivesse feito isso?” Ou “e se eu houvesse agido diferente?” E esta é uma sentença que pode ser perpétua, se o condenado não enxergar que – não importam as causas – o amor se foi e nada mais pode ser feito.
Sim, todo amor que acaba é triste e um luto deve ser cumprido, mas tal resguardo não pode se transformar em um museu de sentimentos, no qual estaremos servindo como meros visitantes das obras ali expostas – posso ver, mas não tocar. Isso é torpe, cruel ainda que autoimposto, e deve ter um fim no mais breve tempo possível. Gastar uma vida entre lamentos e saudades é condenar-se à estagnação e, queiramos ou não, os dias passam.
Falar é fácil, entretanto. Para alguém como eu, que reconhece a própria doença, torna-se quase um cinismo – a apostasia dos mal amados, como já escrevi. Mas gastei décadas de minha vida entre fracassos e lembranças, poucos anos me restam e não pretendo gastá-los na ante sala de um museu.
Também escrevi, em um arroubo de raiva, que sinto saudades apenas de quem ainda não conheci – mas logo caí em mim e confessei ser a saudade mais dolorosa a que sentia de mim mesmo, de minha inocência e ilusões. Pois que esta última seja jogada no lixo – sou o que sou, um amontoado de defeitos e qualidades e não vou mais me importar com isso.
Que me reste a saudade de quem não conheço – e Deus sabe o esforço que faço por este otimismo.
Um novo dia sempre vem.
Há de vir.
Walter Biancardine

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