terça-feira, 21 de outubro de 2025

MINHA ALMA CANTA...VEJO O RIO DE JANEIRO -


Estou morrendo de saudades, Rio teu mar, praias sem fim, Rio você foi feito pra mim...
Sim, pois chegou a minha vez de cantar o refrigerante “Samba do Avião”, do mesmo Tom Jobim que ensinou meu quase irmão Luís Antônio – The House of Rock and Roll” – a tocar piano.

E eis que me encontro tal qual o Cristo Redentor, braços abertos sobre a Guanabara, sorvendo cada gole de uma tardia mas bem-aventurada volta à minha terra natal, me sentindo novamente nativo a xingar os engarrafamentos, a debutar no estranhíssimo BRT e tendo sempre à mão o deslumbrante caos luminoso da Avenida das Américas, à noite, uma vez já instalado em meu simpático apartamento no Recreio dos Bandeirantes…

Uma outra cidade, outrora capital do glorioso Império do Brasil e também – nada é perfeito – desta soluçante República; uma outra atmosfera, outras pessoas, outras modas, vestimentas, maneiras de falar, linguagem do corpo, dos sons e dos cheiros – tudo isso soube eu no passado, mas duas décadas e meia de exílio deslocaram e quase sepultaram a gênese carioca e estapafúrdia deste que ora vos escreve.

Este artigo é só porquê/ Rio eu gosto de você/ A morena vai sambar/ Seu corpo todo balançar” enquanto eu, da janela do carro, as vejo em um desfile propositalmente blasé, pela orla da praia.

Então, na crônica diária de minha vida, uma nova página se abre e me pego exercitando as pernas no contínuo sobe-e-desce pelas escadas deste duplex – povoado somente por mim, subitamente desperto na vaidade de saber se tais escadas melhorarão o triste aspecto de minhas pernas, em intempestiva volta à adolescência. O amigo leitor não deverá se iludir, se neste momento considera que desfruto de férias cariocas: não, há trabalho – e muito – que ainda me espera.

Trata-se, porém, do saudoso abraço que dou à cidade que me pariu, mostrou a vida e pôs-me a correr o mundo. E a quanto tempo não a via…

Rio de sol, de céu, de mar… Dentro de mais um minuto estaremos no Galeão…
Aperte o cinto, vamos chegar… E vamos aterrar.


Estou de volta, Rio.


Walter Biancardine



domingo, 12 de outubro de 2025

AS VINHAS DA IDEOLOGIA: JOHN STEINBECK E O CULTO AO SOFRIMENTO COMO REDENÇÃO POLÍTICA -



Vi hoje, em uma página que sigo no Facebook, um interessante artigo sobre um livro – depois transformado em filme, o qual vi e muito gostei por sua densidade dramática e apuro na transmissão da angústia “noir” da situação – que se chama “As Vinhas da Ira”. 

Entretanto, é preciso separar a apreciação da bela obra artística, cujas qualidades são inegáveis, da venenosa mensagem que a mesma transmite. Convido o leitor a apreciar o texto postado por esta página – “Sobre Literatura”, no Facebook – e, depois, ter a caridade de ler um resumido ensaio filosófico, no qual exponho meus pontos de vista conservadores sobre ambos – o texto e a obra artística.

O texto:

Em 1936, no auge da Grande Depressão, um homem fez o que poucos escritores teriam coragem de fazer: John Steinbeck abandonou o conforto da sua casa, adotou um nome falso e desapareceu entre os trabalhadores migrantes da Califórnia – para viver a dor que o mundo insistia em ignorar.

As famílias que ele encontrou vinham de Oklahoma e Texas, fugindo da poeira, da seca e da fome. Tinham perdido tudo – a terra, os sonhos, a dignidade – e agora dormiam em caminhões enferrujados, perseguidos por um país que os chamava de “problema”. Os jornais ridicularizavam-nos como “Okies”. Os políticos fingiam que não existiam.

Mas Steinbeck não suportava olhar de longe. “Se queres entender a dor de um homem, caminha com ele na lama”, dizia.

E assim o fez. Dormiu sob as estrelas, comeu restos, ouviu mães tentando acalmar bebés com canções em vez de comida. Viu crianças escavando lixo à procura de frutas podres.

“Não imaginas o som que a fome tem quando chora”, escreveu. “Ela muda o rosto de um homem.”

À noite, enquanto o acampamento dormia, Steinbeck acendia uma lanterna e escrevia – fragmentos de conversas, rostos, gestos, pedaços de humanidade enterrados na miséria. Dessas anotações nasceu uma das obras mais poderosas do século XX: As Vinhas da Ira.

Quando o livro foi publicado em 1939, a América tremeu. Fazendeiros queimaram exemplares em praça pública. Políticos chamaram-no de mentiroso. Igrejas baniram-no das prateleiras. Mas entre os esquecidos, os sujos de poeira e esperança, o livro virou uma espécie de milagre.

“Ele disse a verdade. Finalmente, alguém nos viu.” — disse um trabalhador rural, com lágrimas nos olhos.

O FBI abriu um dossiê contra ele. Recebeu ameaças de morte. Homens armados vigiavam sua casa dia e noite. Quando um amigo perguntou se tinha medo, Steinbeck respondeu apenas:

“Não. Tenho vergonha de ter demorado tanto tempo para prestar atenção.”

Ganhou o Pulitzer, depois o Nobel, mas nunca esqueceu o pó, os rostos e as vozes dos que o acolheram.

“Eu não sou um escritor de fuga”, disse certa vez. “Sou um escritor das pessoas que não conseguem escapar.”

John Steinbeck não escreveu sobre o Sonho Americano – ele viveu com aqueles a quem o sonho foi negado. E foi entre a poeira, a fome e o silêncio que descobriu algo que nem a miséria conseguiu matar: a dignidade humana.

Ele não apenas contou uma história – ele devolveu humanidade a quem o mundo tinha esquecido."

Página “Sobre Literatura”, Facebook -


Meu ponto de vista:

Há textos que choram demais para pensar. O que se escreveu acima sobre As Vinhas da Ira certamente é um desses. Mistura-se ali piedade com propaganda, miséria com moralismo, e o resultado é a canonização do ressentimento humano como se fosse virtude. 

Steinbeck é erigido em mártir de um povo imaginário – não o povo real, que luta, trabalha e reza – mas o “povo-símbolo”, útil à catequese socialista que Hollywood e a intelligentsia universitária transformaram em dogma.

A peça laudatória que ora mostro ao meu leitor começa com uma premissa quase messiânica: Steinbeck, “o homem que abandonou o conforto da sua casa para viver entre os pobres”, a velha fórmula do santo laico. O escritor é apresentado como se houvesse feito um êxodo voluntário rumo à sarjeta, para expiar as culpas do capitalismo. 

E eis a primeira armadilha: confunde-se empatia com militância, e observação com adesão ideológica. Ora, Tolstói também conviveu com camponeses, Dostoievski viveu entre criminosos, mas nenhum deles saiu proclamando a revolução. Entender o sofrimento humano não implica santificar suas causas políticas.

A segunda falácia é a pintura maniqueísta da sociedade americana dos anos 30: de um lado, os ricos insensíveis, do outro, os famintos virtuosos. Ora, toda a história dos Estados Unidos é um esforço de autossuperação, não de vitimização. A Depressão foi uma tragédia econômica, não uma conspiração de banqueiros. Milhões sofreram, sim, mas muitos reconstruíram suas vidas – não pela coletivização sonhada por Steinbeck, e sim pelo trabalho, pela fé e pela perseverança. O que o autor e seus cultores fizeram foi transformar o fracasso em bandeira moral.

O elogio diz que Steinbeck “viu crianças escavando lixo à procura de frutas podres”. Comovente, sem dúvida. Mas o problema não está na compaixão – está no uso político dela. O sofrimento deixa de ser um drama humano para virar uma peça de acusação contra a ordem social. A miséria passa a servir de argumento contra a liberdade, e o escritor torna-se sacerdote de uma liturgia em que o capitalismo é o demônio e o coletivismo, a salvação.

Quando se diz que “a América tremeu” ao ler o livro, o que realmente se quer afirmar é que os pilares morais do individualismo americano foram atacados em seu núcleo: a crença de que o homem é responsável pelo próprio destino. Steinbeck inverte isso: o indivíduo é vítima do sistema, o mal está fora dele, e sua virtude consiste apenas em sofrer. É o mesmo raciocínio que moveu Marx, Lenin e seus herdeiros do Baixo Leblon: o homem bom é o oprimido, o homem mau é o que prospera.

Eis o perigo espiritual escondido no humanismo de Steinbeck: ele troca a tragédia clássica – em que o homem luta contra seu próprio limite – por uma tragédia social, onde o inimigo é sempre o outro. E isso mata a dimensão moral da culpa e da redenção. Em As Vinhas da Ira, ninguém é tentado a ser melhor; todos são convidados a odiar um culpado coletivo.

O artigo acima também celebra o fato de o FBI ter aberto um dossiê contra o escritor, como se toda investigação fosse sinônimo de perseguição. Mas ignora-se a retórica heroica: Steinbeck frequentava círculos marxistas, e o Partido Comunista Americano via “The Grapes of Wrath” como instrumento de propaganda. Isso não diminui o valor literário, mas revela o contexto: a obra foi escrita sob o manto do realismo socialista, o mesmo que transformava a pobreza em emblema moral.

A frase final – “Ele não apenas contou uma história; ele devolveu humanidade a quem o mundo tinha esquecido” – é o golpe de misericórdia da retórica progressista. Ninguém devolve humanidade a quem já a possui. O pobre não é um sub-homem à espera de salvação estética. Essa frase trai o paternalismo dos que veem o povo como massa sofrida a ser “redimida” por intelectuais iluminados. O mesmo paternalismo que, no século XX, gerou regimes onde o Estado dizia amar o povo – e este mesmo povo, tão “amado”, acabou fuzilado, faminto e calado.

Ao fim e ao cabo, Steinbeck não escreveu “As Vinhas da Ira” contra a miséria, mas contra a liberdade. A miséria serviu-lhe de cenário moral para propor um mundo sem responsabilidade pessoal, onde o coletivo seria a tábua de salvação. E eis o truque mais sujo, mais imundo: quanto mais piedade ele aparenta, mais poder o Estado ganha na imaginação do leitor.

O verdadeiro antídoto para a pobreza, como sempre, não veio dos livros militantes, mas do suor de quem reconstruiu a América. Enquanto Steinbeck transformava desgraça em epifania política, homens simples voltavam a arar o solo, fundar empresas, restaurar a vida. E nenhum deles precisou que um escritor os “visse”.

Em suma: As Vinhas da Ira é uma obra literariamente poderosa, mas filosoficamente venenosa. Sublima o sofrimento em ideologia e faz do desespero um instrumento de catequese. O que ela propõe, em última instância, não é a compaixão cristã, mas a revolta secular. É o Evangelho segundo Marx, pregado em tom poético, para corações bem-intencionados e mentes desprevenidas.

Steinbeck escreveu sobre os que “não conseguem escapar”.

Mas o que ele não entendeu – e talvez nem quisesse entender – é que escapar da miséria é justamente o que o comunismo impede.


Walter Biancardine



sábado, 11 de outubro de 2025

VASO RUIM NÃO QUEBRA... NUNCA.


 

LIBERDADE E TRANSCENDÊNCIA -

 


A solidão é o paroxismo da liberdade absoluta, assim como a morte é o da transcendência.

Quando o homem se despoja de todos os vínculos, de toda presença que o define ou limita, ele chega ao ponto extremo - ao ápice febril - da liberdade. A solidão é o laboratório final da autonomia, onde não resta sequer o Outro para servir de espelho ou de obstáculo.
É o clímax ontológico da separação.

Mas, como todo paroxismo, é também o início da dissolução.

A liberdade que perde toda relação com o mundo torna-se abstrata - e o homem livre até o osso acaba sendo livre de tudo, inclusive de si.


Assim como a solidão é o extremo da liberdade, a morte é o extremo da passagem - o último ponto em que o ser rompe o confinamento do corpo e se lança (ou se perde) no absoluto.

A morte é a transcendência levada ao seu ponto-limite, onde deixa de haver quem transcenda.

O amigo Bukowski pode até não gostar, mas conceitualmente creio ter sido impecável.


Walter Biancardine




sexta-feira, 10 de outubro de 2025

NOTEBOOK RENASCIDO, MILAGREIRO DIGITAL E O BIQUINHO DE RABOSO -

 


A partir de semana que vem estarei à 180Km de distância dos milagres cibernéticos de Thiago de Souza que, mais uma vez, acudiu-me e salvou minha ferramenta de trabalho de um fim inglório. Sim, de fato o insubstituível existe e, aqui em Cabo Frio tenho a sorte de contar com dois deles: o já referido santo protetor de meus descalabros jornalísticos e meu mecânico de confiança, Pedrinho Xará, o qual cuida de meus carros há bem uns 25 anos.
Lá no Rio? Nâo faço a menor ideia, hoje sou um turista em minha própria terra natal.

Dito isso, vamos ao biquinho da renúncia sofrida e magoadinha de Raboso, o iluminista iluminado que defendeu os arreganhos do taradão João de Deus e os assassinatos do terrorista Cesare Battisti - sim, o alcance quase divino de suas vistas e a sobrenaturalidade de seu amor a alguns próximos são notórios e dignos de admiração, alcançando tons que nós - reles 213 milhões de pequenos tiranos - não atingimos.

Raboso sente-se particularmente ardido com os problemas que atingirão seu vasto patrimônio nos EUA e sua vaidade desfalece, suspirante, ao não mais ter como intitular-se "professor de Harvard". Sim, nestas circunstâncias Raboso - um músico diletante e apreciador da MPB (Militância Popular Brasileira) - lembrou-se de seu doce amigo Chico Buarque de Holanda, grande entendedor da psique feminina, e fez tal e qual as Mulheres de Atenas, que sofrem e se resignam em silêncio, n'um louvável estoicismo ovariano.

Como o pobre Raboso conseguirá manter-se nos holofotes da mídia? O que será de sua glória? Dos aplausos? Dos flashes ensandecidos dos fotógrafos? A Star is Dead? Ou será, futuramente, Reborn em alguma candidatura? O tempo dirá.

Sim, o tempo dirá e não será apenas isso, pois agora o bárbaro alcoolizado de nove dedos terá a doce missão de indicar - e certamente o submisso Senado aprovará - um novo bibelô pet para o Tribunal do Reich comuno-narco-globalista que governa estas plagas.

O tempo dirá. Dos destinos do Brasil a algum mecânico e técnico de informática merecedores de minha confiança.

Até porque a minha vida pessoal, essa eu já deixei nas mãos de Deus.


Walter Biancardine



sábado, 4 de outubro de 2025

A LONG WAY HOME -


E de repente tudo muda: uma vida inteira dá meia volta, e novas estradas se abrem diante de nós mostrando que a viagem ainda não acabou.

Na verdade talvez mal tenha começado, e todo aquele caminho cheio de tombos, buracos, quedas e machucados esteja ficando para trás.

O dia está chegando, muito próximo, o tanque está cheio e a rota na cabeça.

Agora é quicar a moto, acender um charuto e desfrutar desta "long way home".

Até chegar, beber meu Jack Daniel's e brindar: de volta ao lar.


Walter Biancardine


quinta-feira, 2 de outubro de 2025

FENIX -


Tempos idos, tinha minha enorme moto custom e nela me divertia com meus cabelos longos, colete do motoclube, charuto nos dentes - pois cigarros apagam com o vento - e minhas tatuagens, dentre elas a Fênix, o lendário pássaro que morre e renasce das cinzas.

Não à toa a fiz: muito mais que uma capacidade autoproclamada, era prece e esperança. E neste momento me vejo tal como ela, a renascer de minhas cinzas quase já frias, sentindo outra vez o calor do sol, aspirando o ar à minha volta, sentindo meus músculos novamente fortes - eu, redivivo, renascido e repaginado, com sangue nas veias e um homem novamente.

Bastou uma notícia, uma mão estendida - e seu autor não citarei, por não ter pedido autorização - para que, tal como Lázaro, me levantasse e caminhasse para fora da cova ao encontro dos vivos.

Confesso que jamais me senti assim. Todos sofremos altos e baixos, temos picos e vales mas, desta vez, há algo acima e além. Novamente compromissos, responsabilidades, tarefas, obrigações e a alegria de cumpri-las - mas o corpo não engana, há algo mais e melhor.

A alma volta e quer escrever - e voltarei, pois meus editores aceitaram que retornasse - e me descubro pleno de gasolina para queimar, nesta longa estrada que o Brasil sofre caminhar. A cabeça desperta e volta a trabalhar, com responsabilidades que breve assumirei. E o corpo volta a existir, me dando conta que o mesmo havia me abandonado há anos e sequer percebi.

Mas bastou um chamado.


Walter Biancardine