Uma antiga canção, de um grupo musical feminino norte-americano chamado The Chordettes apelava, nos idos de 1954, a uma criatura folclórica – Mr. Sandman – que trouxesse um sonho para elas.
É preciso discernimento nessa altura da vida, esbarrando perigosamente nos 60 anos, para distinguir se ainda mantemos vivos alguns sonhos ou se os mesmos, que nos acompanharam por toda uma existência, não seriam fuga em traje esporte fino.
Não há motivos para corar quando me dou conta de meus dias serem tomados pelos mesmos ideais da juventude – cevados pelo tanto de enriquecimento intelectual que a vida, generosamente, me proporcionou – e persistir na luta cotidiana por um Brasil decente, um povo de olhos afiados e ouvidos perspicazes, imunes à cantilena canhota, e que imponham o devido respeito aos inúmeros empregados que contratamos: burocratas, técnicos, políticos, magistrados e militares.
Mr. Sandman, traga-me o sonho de um povo consciente de que ele é a fonte, a origem e única justificativa para a existência das leis e instituições, que tão caras nos custam e tantos males nos impõem, pela soberba de acharem-se verdadeira casta.
Mas sou humano, Mr. Sandman, e reconheço que aspirar a uma vida digna – em boa casa, família reunida, filho ao lado e a tão almejada Audrey Hepburn como esposa – despencou, nesta altura de tantos anos vividos, da categoria de sonho para a simples e covarde fuga, praticada todas as noites, agarrado a meu travesseiro e em desesperada tentativa de pegar no sono – outra fuga mas que, ao menos, me refaz para mais um dia. E deste último parágrafo, egoísta e troféu de uma vida derrotada, me envergonho.
Meus dias caminham apressadamente para o fim mas se, ao chegar o último deles, eu houver conseguido a primeira parte de minhas pretensões, fecharei os olhos tranquilo na certeza que meu filho não herdará nossa desfaçatez, hipocrisia vermelha e passividade cotidianas.
Isto sim, será verdadeiro troféu.
Would be so peachy before we're too old
So please turn on your magic beam
Mr. Sandman, bring us, please, please, please
Mr. Sandman, bring us a dream
Um comentário:
O sonho é a força que nos faz ficar de pé!
Ótimo texto.
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