Em nossa egolatria cotidiana, por vezes aspiramos a sabedoria e exibimos pretensões de adesivar toda a transcendência da Paixão de Cristo e da Páscoa às nossas misérias particulares, traçando similaridades entre o sofrimento do Verbo Encarnado e o nosso próprio.
Tal ato, embora vil e pretensioso, é compreensível e justificável pois não fosse esta possibilidade e a Palavra de Deus mofaria em alturas inacessíveis, a ninguém alcançando; é a forma primária de empatia, de sentir algo “semelhante” e identificar-se com o relato.
Não escapei de tal tentação e defini o atual momento de minha vida como uma longa sexta feira de trevas, vendo-me despojado de tudo, escarnecido e cumprindo uma espécie de condenação, ao viver no mais baixo degrau da condição humana. Minha soberba vai além e move tal identificação para o fato de, semelhante ao Cristo, ver-me nu mas conservando a integridade interior – no meu caso, a do intelecto – e direciona toda essa conjuntura, quase herética, à fé que me trará a Páscoa, a ressurreição, o reerguimento pessoal quando obtiver novamente uma vida normal.
A Páscoa é a passagem, o Pessach judeu, e consolo-me entendendo as privações atuais como apenas uma parte do caminho a percorrer, meus quarenta anos no deserto.
Condenem-me o quanto quiserem, pois é merecido. Apenas creio que não sou diferente de ninguém e, igual, busco desesperadamente lenitivos para as feridas abertas que tanto incomodam: no que erro, outros já erraram; em minha soberba, outros igualmente o foram; em meu egoísmo, outros também com nada mais preocuparam-se, além de si mesmos.
Hoje é domingo de Páscoa e a cruz foi vencida, junto com a morte. Jesus ressuscitou e nos salvou mas, ao descer os olhos sobre mim mesmo, nenhuma semelhança permanece. Eu, tal como milhões de outros humanos miseráveis, ainda não venci meu opróbrio. Permaneço em duradoura sexta feira de trevas e esta compreensão é o castigo por minha soberba.
Em minha cegueira, desconsidero o sacrifício de Jesus para salvar minha alma e preocupo-me, inconformado, com a salvação de meu bolso.
E esse texto, repleto de palavras como "eu", "meu", "mim" ou "minha" como tantos outros, é o atestado público de minha pequenez.
Walter Biancardine
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UM E-BOOK DELICIOSO: GISLAINE DOS 3 VERÕES
Esta é uma coletânea de contos, escritos entre 2007 e 2010, que reproduzem as histórias e causos que, invariavelmente, escutamos ao ambientarmo-nos em alguma cidade pequena e fazermos amigos.
Tais causos – a versão roceira das lendas urbanas – foram por mim escutados desde muito jovem, na então pequena e desconhecida cidade de Cabo Frio, Região dos Lagos, Rio de Janeiro.
Não ouso dizer que nenhuma delas seja verdadeira, contudo tantas e tão repetidas vezes as ouvi que resolvi publicá-las em livro, para que ganhem a notoriedade – ou infâmia – merecida.
Divirtam-se com elas.
Mas se me perguntarem se é tudo verdade, jurarei que só ouvi dizer.
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